O estímulo a produção de HQs como valorização cultural e desenvolvimento econômico
“Leitura recomendada às pessoas de sete a setenta e sete anos”
Essa frase sugestiva costumava vir estampada nos álbuns do personagem Titim, criado em 1929, por Hergé, artista belga que foi chamado o “Walt Disney Europeu”.
Tintim, hoje com 82 anos de idade, acompanhado de seu fiel cãozinho Milu e por todos os demais personagens que fazem parte de seu universo mágico, durante muitos anos ocupou o imaginário de muitas gerações, desde quando o mundo ainda não conhecia o computador.
Com Tintim e seus companheiros de aventuras podíamos viajar pelo mundo inteiro, “do Oriente Médio aos Andes, da Rússia ao Congo, da Lua ao mais profundo dos mares”. Isso era parte do segredo e magia desse personagem, que fez a alegria de tantos leitores de HQ e que vendeu mais de 200 milhões de álbuns em cerca de 50 idiomas.
Hoje existe na Bélgica, na cidade de Louvain-la-Neuve, a 30 quilômetros de Bruxelas, o belo Museu Hergé, especialmente projetado para sediar a obra do criador de Tintim, que é considerada patrimônio cultural e econômico do país.
O mesmo acontece com muitos outros personagens, em várias outros países, entre eles podemos citar Mickey, Pato Donald, Popeye, Superman, Batman, Homem Aranha, isso para falar apenas sobre os mais conhecidos de uma enorme quantidade de heróis de papel.
Os principais países do mundo investem maciçamente no incentivo a produção de quadrinhos, porque sabem que estão investindo, não só em algo que gera receita, mas que também valoriza sua cultura. Hoje nossos jovens consomem hoje enorme quantidade de literatura em quadrinhos, principalmente os “mangás”, como são chamados os quadrinhos japoneses.
E nós, no Brasil, o que fazemos?
Somos grandes consumidores, nossas bancas estão abarrotadas de HQs, produzidas nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, mas é raro encontrar quadrinhos nacionais, salvo algumas exceções, como os quadrinhos de Mauricio de Souza (Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali).
Nossos jovens são consumidores vorazes das HQs e não se dedicam só a ler, mas também a desenhar e criar histórias, sonhando um dia poderem, quem sabe, serem desenhistas de suas próprias HQs, criando seus personagens, no estilo dos comics americanos ou dos mangás japoneses, mas quem sabe, com conteúdo baseado em nossa própria cultura e riquíssimo folclore.
Estimulando e apoiando a produção e publicação de HQs nacionais estaríamos exportando nossa cultura para outros países, não só contribuindo para com nossa economia, mas participando desse grande intercâmbio cultural mundial.
Já temos no Brasil muitos jovens talentosos desenhando para estúdios americanos. Aqui em Santa Maria temos um desenhista que se dedica a produção de HQ para um estúdio nos Estados Unidos e em outros estados do país existem outros.
Mas não é só isso:
Os jovens que se dedicam ao desenho, como também aqueles que têm afinidade com outras formas de arte, são extremamente sensíveis e eles existem aos milhares nas nossas escolas. São alunos um pouco diferente daqueles outros, que tem aptidão para outras atividades, como esportes, tecnologia e atividades práticas. Nossos jovens artistas são diferenciados por sua sensibilidade e criatividade e precisam ser estimulados com oportunidades e apoio para dar vazão a seu maravilhoso dom. Se puderem exercitar e evoluir sua capacidade criativa e artística, eles serão jovens que no futuro contribuirão para com o equilíbrio psicológico, material e cultural de nosso país.
O incentivo e estimulo, na prática
Através de nossa história experimentamos algumas iniciativas muito válidas para estimular a produção de quadrinhos nacionais e o Rio Grande do Sul tem parte importante nisso. Na década de 50 criou-se uma cooperativa de desenhistas e argumentistas de Histórias em Quadrinhos em Porto Alegre, que contou com o apoio do Governador Leonel Brizola e a nível nacional houve o apoio do Presidente Jango Goulart que estimulou a criação de uma lei que estabelecia certa reserva na publicação de HQs no país, assim, para tantas histórias estrangeiras publicadas deveria haver outras tantas HQs brasileiras.
A CETPA- Cooperativa e Editora de Trabalho, foi responsável pela produção de várias HQs nacionais, entre elas “SEPÉ” e “ABA LARGA”, que acabou gerando um filme longa metragem, rodado em Santa Maria, com figurantes atores daqui, entre eles nosso Edmundo Cardoso.
A lei, até hoje não foi implementada e acabou não trazendo nenhum resultado prático.
Santa Maria e a produção de histórias em quadrinhos e humor gráfico
Nossa cidade tem tradição na produção de quadrinhos e humor gráfico, isso é reconhecido nacionalmente desde há muitos anos. Já na década de 70 tivemos trabalhos em quadrinhos daqui publicados em editoras de São Paulo. Em 80 criamos e publicamos a revista Quadrins, depois veio a Nativismo e em 80 publicamos a revista Garganta do Diabo. Criamos aqui o Santa Maria Cheia de Graça Salão de Humor do Mercosul edições I e II e mais recentemente temos realizado o CARTUCHO – Encontro de Cartunistas Gaúchos, que já está a caminho de sua 7ª edição. Toda essa atividade tem colocado nossa cidade em posição de respeito e reconhecimento em nosso país e até internacionalmente, quando da realização dos Salões de Humor, que tiveram a participação de concorrentes de vários países do planeta.
Os quadrinhos na escola
A par de toda essa movimentação que coloca Santa Maria como pólo de estimulo e produção de histórias em quadrinhos e cartuns em relação ao RGS e ao país, podemos destacar nosso trabalho individual, pois temos aqui bons cartunistas e quadrinhistas, que tem se dedicado não só a seu trabalho, mas também a promoção de oficinas e cursos de desenho de humor e quadrinhos nas escolas do município e faculdades de comunicação daqui e de outras cidades do estado.
Há mais de 10 anos tenho ministrado oficinas de HQ a muitos jovens, com resultados emocionantes e extremamente gratificantes, culminando com a publicação em algumas dessas oportunidades dos trabalhos produzidos, confirmando que, com estimulo e acompanhamento técnico é possível produzir histórias em quadrinhos entre os estudantes das escolas públicas, contribuindo para isso com a melhora da sua auto-estima através da comprovação de suas capacidades produtivas individuais.
É claro que é necessário pensar e desenvolver um programa que dê continuidade a esse processo, garantido que esses jovens possam continuar a desenvolver sua aptidão e no futuro possam exercer uma profissão que lhes de dignidade e sustentação. É um processo longo e complexo, mas nossa experiência de longos anos nos garante que é possível.
O que é possível fazer
Acredito que é possível desenvolver o projeto “HQ NA ESCOLA” inicialmente para alguns colégios da rede de ensino pública, em Santa Maria, nos moldes do que foi desenvolvido na Escola João Belém (material em anexo), contando com o apoio de outras instituições, como a UNIFRA e a UFSM, que ministra uma cadeira de Histórias em Quadrinhos no Curso de Desenho Industrial, com a garantia de publicação dos trabalhos produzidos.
A seguir é necessário selecionar aqueles jovens que demonstrarem maior interesse para continuar recebendo orientações, em níveis mais avançados e para que possam desenvolver seu dom e sua capacidade de produzir sua arte profissionalmente no futuro.
O projeto poderá mais adiante ser ampliado, contando para isso com a participação de maior número de escolas e profissionais da área.
Paralelamente é necessário estimular a produção e publicação de HQs desenvolvidas por autores do estado que já estejam em níveis mais desenvolvidos, com temáticas relacionadas a nossa cultura, com isso, quando os jovens que estivermos preparando chegarem a uma formação mais adequada poderão contar com um mercado para absorver seu trabalho.
Feliz dia dos quadrinhos e boa leitura!
Byrata byrata@hotmail.com
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